Interessante neste dia do circo lembrar também do bobo da corte que nas peças de Shakespeare, ao contrário do que se pode pensar, representava a sabedoria, alguém que no meio das mentiras tinha a coragem de dizer a verdade, e sua "bobeira" lhe servia de escudo para que ninguém o repreendesse severamente.
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Neste dia... de bobos, palhaços, circos, artistas, e amigos da verdade...
Um texto da Clarice Lispector para vocês!

Das vantagens de ser bobo
O bobo, por não se ocupar com ambições, tem tempo para ver, ouvir tocar no mundo. O bobo é capaz de ficar sentado quase sem se mexer por duas horas. Se perguntado por que não faz alguma coisa, responde: "Estou fazendo, estou pensando."

Ser bobo às vezes oferece um mundo de saída porque os espertos só se lembram de sair por meio da esperteza, e o bobo tem originalidade, espontaneamente lhe vem a idéia. O bobo tem oportunidade de ver coisas que os espertos não vêem. Os espertos estão sempre tão atentos às espertezas alheias que se descontraem diante dos bobos, e estes os vêem como simples pessoas humanas. O bobo ganha utilidade e sabedoria para viver. O bobo parece nunca ter tido vez. No entanto, muitas vezes, o bobo é um Dostoievski.

Há desvantagem, obviamente. Uma boba, por exemplo, confiou na palavra de um desconhecido para a compra de um ar refrigerado de segunda mão: ele disse que o aparelho era novo, praticamente sem uso porque se mudara para a Gávea onde é fresco. Vai a boba e compra o aparelho sem vê-lo sequer. Resultado: não funciona. Chamado um técnico, a opinião deste era que o aparelho estava tão estragado que o concerto seria caríssimo: mais vale comprar outro. Mas, em contrapartida, a vantagem de ser bobo é ter boa-fé, não desconfiar,e portanto estar tranqüilo. Enquanto o esperto não dorme à noite com medo de ser ludibriado.

O esperto vence com úlcera no estômago. O bobo não percebe que venceu. Aviso: não confundir bobos com burros. Desvantagem: pode receber uma punhalada de quem menos espera. É uma das tristezas que o bobo não prevê. César terminou dizendo a célebre frase: "Até tu, Brutus?" Bobo não reclama. Em compensação, como exclama!

Os bobos, com todas as suas palhaçadas, devem estar todos no céu. [...] O bobo é sempre tão simpático que há espertos que se fazem passar por bobos. Os espertos ganham dos outros. Em compensação, os bobos ganham a vida. Bem-aventurados os bobos porque sabem sem que ninguém desconfie. Aliás não se importam que saibam que eles sabem. Há lugares que facilitam mais as pessoas serem bobas (não confundir bobo com burro, com tolo, com fútil). Minas Gerais, por exemplo, facilita ser bobo. Ah, quantos perdem por não nascer em Minas! Bobo é Chagall, que põe vaca no espaço, voando por cima das casas. É quase impossível evitar excesso de amor que o bobo provoca. É que só o bobo é capaz de excesso de amor. E só o amor faz o bobo.

2 Comments

  1. Anônimo Says:

    Olá,tudo bem?
    Muito interressante seu blog.
    Diferente de outros que apenas tratam de suas próprias vidas,e em alguns casos,na minha modesta opinião,apenas existem banalidades,futilidades~.Já o seu não,fala de todos os assuntos.
    Muito inteligente e criativa sua idéia.
    Adorei mesmo.
    Um beijo.
    Letícia,23 anos.
    São Paulo,SP.
    S

     
  2. Fátima Nascimento Says:

    Já conhecia este texto da Clarice Lispector, que me foi apresentado por uma colega também de blog. Estou conhecendo agora este seu espaço. Certamente que voltarei outras vezes. Fique em PAZ!